1.1
Entram
Rosinha e Maria, uma loja é descoberta.
ROSINHA
A
senhorita já fez seus deveres de virginal?
MARIA
Sim.
ROSINHA
Sim,
você tem sido uma parva por esses dias, penso que precisa de algo
p'ra
avivar
essa anemia;
tá
chorando? Um marido. Não tivesse tal pedaço de carne sido
instituído, para que de bom serviríamos nós esposas? Para verdura,
ou então sermos
apregoadas por aí como
temperos.
Está tudo mudado nestes tempos! Quando eu era da sua mocidade, eu
era ligeira,
e fecunda, dois anos antes de casar. Até
parece que você
se presta à cama de um fidalgo! Semblante
sonolento, olho mortiço e espírito embotado! Aposto minha vida que
esqueceu sua dança: quanto
tempo
faz que esteve
com você o dançarino?
MARIA
Uma
semana.
ROSINHA
Isso
tudo?
Quando eu tinha
seu calibre,
Ele
não me
falhava
uma noite, me
ocupava;
Eu
me deleitava em aprender, ele em me ensinar;
Um
belo
moreno, tinha
prazer em minha companhia;
Mas
você é devagar,
não tem
ligeireza alguma,
Dança
como uma filha de encanador, e merece
Duas
mil libras em chumbo pro
casamento,
E
não em ourivesaria.
Entra
Dourado.
DOURADO
Ora,
qual é a balbúrdia entre mãe e filha, hein?
ROSINHA
Ora,
bobagem, apontando a sua filha Maria
seus delitos.
DOURADO
“Delitos”!
Não,
a city
não lhe basta, hein
mulher,
Você
precisa ir
buscar
palavras em Westminster;
Pois
p'ra
mim, já
chega...
Nenhum
escriba
de advogado aqui
esteve
E
trocou a
meia-coroa
que
ganhou da mãe,
Ou
então
te enganou
com
uma de dois pence
folheada,
P'ra
por em voga a palavra para
suas
faltas
Ou
fissuras no dever
e na obediência?
Chamemos
assim, doce esposa.
Assim
como não há mulher feita sem falha alguma,
O
mais puro linho desfia, e
cambraia
fura.
ROSINHA
Mas
é marido que calafeta
toda fissura.
MARIA
Como,
ele chegou,
senhor?
DOURADO
Sir
Walter chegou.
Foi
visto na Ponte Holborn,
e
estava na companhia
De
bela e composta senhorita, a qual imagino,
Dado
o pelo rubro e outras luxuriâncias,
Ser
sua sobrinha, dona de terras em Gales,
Que
nosso
Tim, o
guri de Cambridge, vai desposar.
São
núpcias pensadas pelo próprio Sir Walter:
Eternamente
nos atam, e a nossos herdeiros.
ROSINHA
É
uma honraria então,
fosse a rapariga humilde,
E
o beijasse com devoção quando ele entrar.
Eu
não consigo, por minha vida!
Instruí-la
a por as mãos assim, na frente e atrás,
Tal
como
esperam
os
fidalgos,
na
frente e atrás.
Eu
sempre digo a ela, é um meneio de mulher
Que
costuma mover um homem, e faz efeito.
Mas,
meu bem, o senhor mandou nota a Cambridge,
Tim
foi avisado?
DOURADO
Foi
desde o outro
dia, quando
você lhe
enviou
a colher de prata p'ra
tomar sua sopa no salão, junto
a sua confraria.
ROSINHA
Oh,
em bom tempo.
Entra
um
Mensageiro.
DOURADO
O
que seria?
MENSAGEIRO
Uma
carta de um cavalheiro de Cambridge.
DOURADO
Oh,
um dos mensageiros
de Hobson,
é
bem-vindo.
ROSINHA
Do
que se trata?
DOURADO
Não,
por minha alma que não sei, não me pergunte:
Ele
ficou verbal demais; esse estudo é uma bruxa.
ROSINHA
Deixa
eu
ver,
por
favor, eu
costumava entendê-lo.
Amantissimus
charissimus:
mandei
este camarada, diz ele; ambobus
parentibus:
buscar um par de botas; patri
et matri:
paguem e
mandem.
MENSAGEIRO
Sim,
pelos céus, minha senhora! Não
é
a interpretação
correta;
eu me esforcei um bocado, e venho da estalagem Bell
suando. Deixa eu tentar, já que fui acadêmico quarenta anos atrás.
É
assim, garanto: matri,
mandem;
ambobus
parentibus,
buscar
um par de botas; patri,
paguem; amantissimis
charissimis,
mandei
este camarada,
e seu nome é Simão, e nisso ele diz a verdade, meu nome é mesmo
Simão; não esqueci todo meu
estudo. Questão de dinheiro, eu sabia que ia acertar.
DOURADO
Você
é uma raposa velha! [Dá
dinheiro a ele.]
Toma
aí
um
tester.
MENSAGEIRO
Se
eu ver
vossa
excelência
na Feira do
Ganso,
eu tenho umas
passarinhas
pro senhor.
DOURADO
Ora,
você mora em
Bow?
MENSAGEIRO
A
vida toda, senhor; e quando
em
Bow,
'cê tá convidado
a foguear
o ganso.
Adeus a vossa
excelência.
Sai
Mensageiro.
DOURADO
Um
mensageiro divertido.
ROSINHA
E
como poderia ser diferente, vindo com cartas de Cambridge, do nosso
filho Tim?
DOURADO
O
que é isto aqui? [Lê]
Maximus
diligo?
Santa misericórdia, eu devo buscar aconselhamento gabaritado para
esta questão,
ou isto
nunca
se
discernirá.
ROSINHA
Busca
meu primo então, na Escola de Direito.
DOURADO
Que!
Lá
são cheios de francês,
não falam latim.
ROSINHA
Então
o vigário vai conseguir.
Entra
um Cavalheiro com uma corrente.
DOURADO
Não,
ele renega,
Acha
latim coisa de católico, não passa
perto.
[Ao
Cavalheiro]
De
que precisa, senhor?
CAVALHEIRO
Rogo,
pese esta corrente.
Entram
Sir Walter Cachorrão,
Dama Galesa e Davi Venká,
e
conversam à
parte.
SIR
WALTER
Aí,
meu
bem,
seja bem vinda ao coração
Da
cidade
de Londres.
DAMA
GALESA
Duw
cato chwi.
SIR
WALTER
Você
pode agradecer em inglês, se quiser.
DAMA
GALESA
Posso,
de modo simples.
SIR
WALTER
Vai
dar de sobra, meu bem;
Seria
estranho eu ir
pra cama
contigo tanto
E
te deixar sem inglês; seria desnaturado.
Eu
te crio para
te transformar em ouro, meu
bem,
Fazer
seu
fado
brilhar
tal
sua ocupação.
Joalherias
fabricam
donzelas
da city.
Davi
Venká,
nem uma palavra.
DAVI
Mudo,
senhor.
SIR
WALTER
[À
Dama Galesa]
Aqui
você deve passar por virgem.
DAVI [À
parte]
Pura
virgem galesa!
Ela
perdeu
o cabaço em Rhompimenshire.
SIR
WALTER
Que
está a ruminar,
Davi?
DAVI
Tenho
dentes, senhor,
Não
preciso ruminar por
mais
quarenta anos.
SIR
WALTER [À parte]
O
puto
está afiado!
DOURADO [Para
o Cavalheiro]
Seu
preço, senhor?
CAVALHEIRO
Cem
libras, senhor.
DOURADO
Cem
marcos
no máximo, do
contrário
não me
interessa.
Sai
o Cavalheiro.
Sir
Walter se aproxima.
Ora,
Sir Walter Cachorrão?
MARIA
Pela
morte! [Sai.]
ROSINHA
Filha!
Nossa!
Essa
rapariga!
Sai
Dourado atrás de Maria.
[A
Sir Walter]
Garota
arredia;
jovens são desconfiadas.
Além
disso, o senhor tem uma presença, Sir Walter,
Capaz
de intimidar uma donzela da city;
Entra
Dourado, trazendo
Maria.
Nobres
almas da corte as fazem tremer,
E
abraçar com as coxas sacodindo.
Lá vem ela.
SIR
WALTER [A Maria]
Ora,
vem cá, bela senhorinha, agora eu te peguei.
Como,
calunia tanto seu tempo fugindo
Assim
de seu fiel criado?
DOURADO
Ih,
tais
palavras,
fidalgo,
vão
fazê-la corar,
Soam
elevadas demais pras nativas da city.
“Honra”,
“fiel criado”! Esses
são
elogios
Pras
damas
importantes
de Whitehall ou Greenwich.
Palavras
da lida, simples
e suficientes, nos servem.
E
esta nobre dama é sua distinta sobrinha?
SIR
WALTER
O
senhor pode abordá-la
nesses termos; sim,
é
ela,
Herdeira
de
dezenove montanhas.
DOURADO
Oh,
bênção!
O
senhor me cumula de amor e de
riquezas.
SIR
WALTER
E
todas
tão
altas
quanto
a
St. Paul.
DAVI [À
parte]
Olha
o golpe!
SIR
WALTER
O
que disse,
Davi?
DAVI
Mais
altas, senhor, de longe: não dá p'ra ver o cume delas.
DOURADO
O
que, homem! Rosa, saúda esta nobre dama,
Nossa
nora, se tudo der certo.
Entra
Espoleta Júnior.
ESPOLETA
JÚNIOR [À
parte]
Meu
fidalgo, com uma parelha de lacaios,
Cá
veio conseguir
pra
ovelhinha
Um
carneirão chifrudo
em Londres; eu devo ter pressa,
Ou
então passar fome. Na carne ela
me tem,
E
isso me assegura.
Bem,
fidalgo,
tal
rico espólio
Para
mim está reservado.
Chama
Maria
à
parte.
MARIA
Senhor?
ESPOLETA
JÚNIOR
Não
me busque até que o possa fazer na lei, isso só aguça meu apetite,
que tão afiado já está. [Entrega um bilhete]
Leia com atenção este bilhete, não me levante suspeita, nem
reconheça meu zelo alhures que em seu peito; leia, e envie sua
reação em três palavras, estarei à mão para recebê-la.
DOURADO [A
Sir Walter]
Oh,
Tim,
senhor, Tim!
Um
simples
rapaz normal, vai
à
universidade,
Atinge
na Quaresma
o
Bacharelado em Artes;
E
será chamado de Sir Dourado, então,
Por
toda Cambridge; isso já é meia fidalguia.
ROSINHA
Gostaria
de se aproximar e provar da recepção da city,
senhor?
DOURADO
Vem,
bom
Sir
Walter,
e sua virtuosa sobrinha.
SIR
WALTER
É
fino aceitar cortesias.
DOURADO
Mulher,
entra com eles.
SIR
WALTER
Sua
companhia, senho?
DOURADO
Eu
lhes concedo em breve.
Saem
Rosinha, Sir Walter, Davi e Dama Galesa.
ESPOLETA
JÚNIOR
[À
parte]
Como
se intrometem o diabo e as riquezas;
Pobre
alma, duro cárcere, o olho da mãe
É
cruel com ela, a ele sendo gentil.
Seria
engraçado fazê-lo trabalhar
Num
anel de casamento p'ra ela; assim farei:
Antes
que o lucro coubesse a qualquer estranho,
É
honestidade minha enriquecer meu sogro.
DOURADO [À
parte]
A
garota é teimosa demais; o que temo
Mais
que tudo é que já tenha outros amores,
Aí
complica-se
tudo; deve-se
acompanhar;
Não
se pode ter cuidado demais com os filhos.
[A
Espoleta Júnior] Do que precisa?
ESPOLETA
JÚNIOR
[À
parte a Maria]
Oh,
nada agora, tudo que desejo está presente.
[A
Dourado]
Preciso
de
um
anel de casamento para
uma nobre,
Com
a rapidez que for possível.
DOURADO
De
que peso, senhor?
ESPOLETA
JÚNIOR
Algo
como meia onça;
Belo
e composto,
com o
lume
dum diamante.
Senhor,
seria uma
pena estragar
tal graça.
DOURADO
Por
favor,
deixe-me
ver;
[Toma
o diamante.]
De
fato, senhor, é dos puros.
ESPOLETA
JÚNIOR
Como
a senhorinha.
DOURADO
Tem
a espessura do dedo
dela?
ESPOLETA
JÚNIOR
Pois
sim,
eu
já tomei com ela as medidas necessárias.
[Procura
um papel]
Pelos céus, escondeu-se, não posso mostar,
Precisava
por tudo p'ra fora p'ra ter certeza.
Deixe-me
ver: longos, esguios, de nós bem compostos,
Uma
nobre senhorinha
tal
e
qual
sua filha, senhor.
DOURADO
E
portanto, senhor, nobre alguma.
ESPOLETA
JÚNIOR
Garanto
jamais ter visto duas moças de mãos tão similares;
Não
procuro mais, se o senhor o consentir.
DOURADO
Se
ousar investir no dedo dela,
senhor.
ESPOLETA
JÚNIOR
Sim,
e assimilo as perdas, senhor.
DOURADO
É
o que diz, senhor? Vem até aqui filha!
ESPOLETA
JÚNIOR
Ouso
pedir um instante seu dedo, nobre dama.
MARIA
A
seu dispor, senhor.
ESPOLETA
JÚNIOR
[Experimenta
o anel no dedo dela.]
Entrou
direitinho,
senhor.
DOURADO
E
o que vai gravar, senhor?
ESPOLETA
JÚNIOR
Nossa,
tem isso, a gravação; assim, senhor:
“Amor,
se for sagaz,
Cega
os olhos dos pais.”
DOURADO
Ora,
quê? Se puder falar sem ofensa, senhor,
Por
minha vida que...
ESPOLETA
JÚNIOR
O
que, senhor?
DOURADO
Vamos,
me perdoa?
ESPOLETA
JÚNIOR
Perdoar?
Mas claro, senhor.
DOURADO
Perdoa
mesmo?
ESPOLETA
JÚNIOR
Sim,
garanto.
DOURADO
O
senhor vai roubar a filha de alguém, estou quente?
Por
que se vira? Vocês jovens da nobreza são uns pândegos;
Não
sei como conduzem a coisa tão à surdina,
E
os pais se cegam tanto; mas eles merecem,
Pois
têm dois olhos e de enxergar se esquecem.
ESPOLETA
JÚNIOR
[À
parte]
Que
lhe caiba seu destino.
DOURADO
Meio
dia amanhã estará
o anel pronto.
ESPOLETA
JÚNIOR
Sendo
assim,
é logo;
grato, [Para
Maria]
e
sua
licença, doce nobre.
Sai.
MARIA
Não
foi nada, senhor.
[À
parte] Fora eu feita de desejos, iria contigo.
DOURADO
Bem,
vejamos
como corre
lá dentro a folia.
MARIA [À
parte]
Lá
perco
o que ganhei; me
foge toda alegria.
Saem.